Entre as coisas que marido não gosta quando está em casa, é que a mulher fique de papo com as amigas ao telefone e muito menos que as amigas venham visitá-la. Também odeiam que a mulher saia para cuidar da beleza, fazer compras etc. Meu marido não é exceção. Ele quer a mulher todinha pra si. Se vocês estão pensando em namoro ou passeios, enganam-se. Não é assim que Ricardo quer passar suas férias.

Nos três primeiros dias de suas férias Ricardo levantou tarde, passou o dia de pijama, barba sem fazer. Sem horário pra nada, “curtindo” o descanso.
O que vamos ter para o almoço? Era a pergunta de todos os dias. Como ele tinha levantado tarde, não tinha se exercitado, lógico que estava sem fome. Claro que não achava a comida tão boa, mas não tinha importância, eu não estava participando de nenhum concurso de culinária; apenas saindo da minha rotina diária, e as férias eram do Ricardo.

Sabe aqueles reparos sem muita importância que você deixa piorar, para chamar o profissional competente? Em casa tinha alguns. No quarto dia de férias, Ricardo resolveu ele mesmo consertar, com a desculpa de economizar. Começou pela torneira da pia que não estava fechando direito. Todo encanador tem as ferramentas adequadas e geralmente não precisa de ajudante. Ricardo me nomeou sua “assessora” e minha primeira obrigação era trazer a caixa de ferramentas. Não sei por que a caixa de ferramentas fica sempre em um lugar inacessível e as ferramentas fora dela. Depois de localizar as ferramentas como era minha obrigação no novo cargo, fui fechar o registro. Ricardo todo empolgado começou desatarraxar a torneira. Não sei se a torneira era de má qualidade ou se ele não era a pessoa mais indicada pra este serviço, pois o cano quebrou dentro da parede e esguichou água em nós dois. Ele não tinha esgotado a água do cano! Já tendo piorado o suficiente a solução era chamar o encanador. Como era de se esperar ele estava ocupado e só poderia vir à tarde. Como fazer o almoço sem água? Come-se qualquer coisa, disse o Ricardo.

Lá pelas duas horas o encanador chegou, com ares de salvador da pátria e de mão na cintura perguntou como aquilo tinha acontecido. Sem graça o Ricardo falou que não sabia que era tão forte e que da próxima vez teria mais cuidado.

Para consertar um cano quebrado dentro da parede, tem que se quebrar a parede e ainda o encanador teve o desplante de perguntar se tínhamos azulejo de reserva. Nesta altura, acho que o Ricardo estava arrependido ou pelo menos deveria estar, mas falou que seria fácil encontrar azulejo igual. Com azulejo ou sem ele, a solução era quebrar a parede para consertar. Três horas da tarde o conserto estava pronto, a cozinha imunda e ainda não podia abrir o registro. Muito mais tarde a cozinha estava limpa, em ordem e com um remendo na parede. À noite todos estávamos morrendo de fome e o Ricardo comeu sem criticar o jantar, também não elogiou.

No dia seguinte ele não quis saber de serviço hidráulico, partiu para a parte elétrica. Decidiu consertar o chuveiro do banheiro de empregada. Eu tentei fazê-lo desistir dizendo que aquele banheiro não é muito usado, mas o Ricardo disse que é importante ter um chuveiro de reserva.
Como era minha obrigação de assessora, trouxe as ferramentas, fita isolante e desliguei a chave, mas tinha que ser a chave geral, nunca se sabe... Conclusão: sem rádio, sem televisão, microondas e o que é pior, sem vídeo game.. Justo no dia que as crianças tinham combinado de jogar aqui em casa. A Daniela até entendeu a importância de termos o chuveiro de empregada funcionando, apesar de não termos empregada, mas o Jr ficou furioso.

Muitos curtos depois o Ricardo desistiu sem entender porque o chuveiro teimava em não funcionar, afinal ele tinha feito tudo certo!
O eletricista não foi chamado, pois não piorou o suficiente, continuou sem funcionar. Apenas o banheiro e a lavanderia estavam sujos e alagados de tanto abrir e fechar o chuveiro para testar.

Mas isso serviu pra me ensinar a chamar as pessoas especializadas para fazer os reparos, antes de o Ricardo notar.

Depois destes fracassos eu pensei que o Ricardo ia aproveitar as férias, como normalmente as pessoas fazem: indo ao cinema, teatro, praia, ou mesmo em casa lendo um bom livro, mas a sua idéia de diversão era outra. Era descobrir por onde estava entrando água no carro. Para isso, nada melhor do que desmontar. Sabe como é, tirar a maçaneta, o forro da porta, os bancos, os tapetes, e tudo isso na frente da garagem do meu carro. Em conseqüência disso, fiquei impossibilitada de sair, mas me neguei assessorá-lo. Para minha sorte o telefone tocou e era uma amiga com mil novidades, minha tarde estava salva! Peguei um copo de refrigerante e me preparei para o papo, mas toda hora o Ricardo me interrompia para pedir uma coisa muito importante como um pano que não solta fiapos, fita crepe colorida, chave Phillips pequena, do tipo que os relojoeiros usam, deixando bem claro com o olhar que não estava gostando nada, nada que eu não estivesse à sua disposição.

Muito mais tarde eu fui ver se ele tinha terminado, para eu poder sair com o carro. Não tinha, e ainda fiquei com sentimento de culpa, pois o Ricardo falou que nunca viu ninguém gostar tanto de sair de carro.

Quando ele se deu por satisfeito com o seu carro, entrou dizendo que estava impecável! Então eu perguntei se ele tinha descoberto por onde estava entrando água e ele se mostrou surpreso, como se não soubesse do que eu estava falando, mas logo lembrou e falou que só saberia quando chovesse.

Um novo dia chegou e o Ricardo depois de ler o jornal falou: hoje eu vou dar um trato no seu carro. A minha reação o surpreendeu, pois ele me olhou assustado. Eu apenas falei: não vai mesmo! Timidamente ele tentou me convencer, comparando com o seu carro, mas eu estava irredutível. Até o sentimento de culpa desapareceu. Nesse dia ele ficou meio perdido sem nada pra fazer, até tentou ver televisão, mas não gostou da programação. Enquanto isso eu aproveitei pra ir ao supermercado, (pelo menos).

No oitavo dia ele começou se preocupar com o escritório: será que se lembraram de pagar a duplicata tal? Será que tinham telefonado para não sei quem? Achou melhor telefonar pra saber se estava fazendo falta e ficou decepcionado por descobrir que estavam se virando sem a sua presença. Ficou calado, pensando. De repente falou: que tal você arrumar as malas pra nós viajarmos? Sabe o que eu respondi? As malas já estão prontas.

1 comentários:

Anônimo disse...

Que texto legal!
Prendeu a minha atenção.
Enquanto lia, pensava que esse tipo de texto poderia ilustrar alguma minissérie de crônicas da globo baseadas nas experiências das mulheres e os seus maridos. Ô Ricardo atrapalhado, hein?!
Fiquei imaginando o olhar esquivado dela quando a água espirrou neles dois diante do cano quebrado.
Hehehehe.
Abraço, pessoal.

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