EPÍLOGO


O final de semana chegou sem que Janaina ligasse.
Adalberto e sua mulher estavam na casa de Helena e Jorge para ver as fotos e falarem da viagem. Os filhos como sempre tinham compromisso fora de casa. A reunião estava muito agradável. Helena como boa anfitriã tinha providenciado comida e bebida para o dia todo. Não fosse pela preocupação com Janaina, Jorge estaria muito feliz. Não sabia no que, mas Helena estava diferente e ele estava gostando dessa mudança. A conversa estava animada: Helena contando da viagem, Adalberto e sua mulher comentando as viagens que sempre faziam, os restaurantes que freqüentavam, que Jorge ficou um tantinho interessado em viajar. Ia falar isso quando a campainha tocou. Jorge perguntou se Helena tinha convidado mais alguém. Não tinha convidado. Dona Genoveva foi atender e veio chamar Helena. Quando chegaram a outra sala dona Genoveva falou  meio sem jeito que tinha uma moça querendo falar com seu Jorge. A moça disse que ele sabia do que se tratava. Ela veio de táxi. Helena pensou que deveria ser alguém fazendo pesquisa e foi dispensar. Dona Genoveva foi junto, preocupada. Quando Helena viu a moça, percebeu que não era pesquisadora. Não sabia se deveria falar com ela ou chamar Jorge. Mandou dona Genoveva chamar Jorge e ficou parada olhando pra moça que segurava um envelope, tentando entender o que estava acontecendo. Jorge veio, aborrecido com a interrupção e quando viu Janaina no seu portão, quase desmaiou. Pela palidez dele Helena não teve dúvidas  de quem era a moça. Isso não podia estar acontecendo, pensaram os dois. Jorge não sabia o que fazer, queria acordar desse pesadelo. Helena tentando manter a calma falou pra ele ir falar com a moça. Sem opção ele foi. Abriu o portão e perguntou o que Janaina estava fazendo lá. Uma Janaina que ele não reconhecia falou bem alto que tinha vindo resolver o problema dos dois. Jorge falou que ela não deveria ter ido lá.  Falando alto ela disse que ele não tinha deixado outra opção. Preocupados com o escândalo que ela parecia estar disposta a fazer, Helena achou melhor deixá-la entrar. A cabeça do Jorge estava a mil pensando num jeito de sair desta situação sem que Helena desconfiasse.  Quando Janaina entrou, ela ficou até com dó da Helena, pois ela estava com uma cara tão espantada. Mas  melhor mesmo era ver a cara do desgraçado: puro pavor! Ele que não se atrevesse a morrer. 
Como Jorge não falava nada Helena perguntou o que a moça queria. Janaina falou que queria apenas o que ela tinha direito. Jorge se recobrou e falou que ela não tinha direito a nada, que não entendia o que ela estava fazendo ali. Janaina então falou em voz bem alta o que ela tinha ensaiado tantas vezes: Que agora na frente da mulher ele se fingia de  santinho, mas quando eles estavam no motel ele era bem diferente. E começou a descrever com riqueza de detalhes o que, e como eles faziam no motel. Helena não poderia imaginar humilhação maior. Uma fulaninha vulgar na sua sala falando indecências!  Jorge parecia um boneco sem cor, não tomava nenhuma atitude. Janaina achava que isso era mais que suficiente para que Helena pedisse o divórcio. Então ela deu o golpe de misericórdia: Estendeu o envelope para o Jorge e ele não se animava a pegar. Helena pegou, abriu, olhou e entregou para o Jorge. Janaina não entendia porque Helena estava rindo, será de nervoso?  Jorge parecia não entender o que estava se passando. Neste momento entraram na sala Adalberto e sua mulher, intrigados com a demora dos dois. Janaina adorou, quanto mais gente melhor! Como Jorge não falasse nada, Janaina falou: parabéns, você vai ser papai! Jorge morreu por dentro e num fio de voz falou que não era dele. Todo homem é igual mesmo. Na hora de... descreveu novamente o que acontecia no motel, com palavras e gestos, é uma coisa, mas quando a mulher engravida quer tirar o corpo fora. Helena continuava sorrindo, o casal também, só Jorge insistia na ladainha: não é meu, não é meu. Janaina já estava ficando preocupada. Não era assim que ela tinha imaginado. O seu plano era que Helena o expulsasse e eles fossem embora juntos no carrão do Jorge.
Helena resolveu encerrar a visita. Devolveu o envelope e falou, mais para Jorge do que pra Janaina que o filho não poderia ser dele porque ele tinha feito vasectomia e que ela esperasse a criança nascer pra ver com qual dos homens que ela tinha dormido ela se parecia. Foi a vez de Janaina ficar sem cor. Aproveitando a deixa, Adalberto pegou no braço dela e foi conduzindo-a para fora. Antes que ela saísse Jorge perguntou: quem é Jucimara?
Janaina/Jucimara, foi embora no mesmo táxi em que chegou.
Não tinha mais clima para continuar a reunião. Jorge estava arrasado. Duplamente envergonhado: pelo escândalo e por ter sido traído. E tudo isso na presença do Adalberto.
 Apesar do horror a que tinha sido exposta, Helena achava que Jorge tinha resolvido o dilema que ela se encontrava. Deu motivo de sobra pra separação.
Adalberto perguntou se ela precisava que ele ficasse. Helena disse que não, que ficaria bem. Falou que não queria que os filhos soubessem, o que Adalberto concordou prontamente. Depois que Adalberto se foi Helena recolheu as fotos e perguntou se o Jorge queria conversar. Ele falou que só queria pedir perdão pelo constrangimento que ele tinha feito ela passar. Helena falou que isso não tinha perdão. Falou que ele não precisava ir embora hoje, pois ele estava muito abalado. Quando ele se sentisse melhor deveria ir. Jorge agradeceu, sabia que não tinha condição de ir a lugar algum e sabia que não tinha o direito de ficar.





                                                                      Jorge


À noite quando Jorge chegou em casa já notou a diferença. Um cheiro bom de comida, os filhos em casa e Helena. Abraçou-a e sentiu o seu perfume. Tinha se esquecido como era bom. Nossa como ela estava bonita! Pelo jeito a viagem tinha feito bem pra ela. Precisava fazer média, então a elogiou. Perguntou como tinha sido a viagem e na primeira oportunidade falou que tinha reencontrado um amigo do tempo de solteiro que falou para os outros amigos e insistiram em marcar um churrasco para relembrarem os velhos tempos. Como a sua casa  era a maior fizeram o churrasco lá. Helena não se importou e até perguntou se foi bom encontrar os amigos. Jorge falou que nem tanto, pois com o tempo eles tinham ficado muito diferentes do que ele se lembrava. Aproveitou pra falar que como não tinha experiência em organizar festas, contratou uma empresa não muito boa. Também falou que deu folga pra dona Genoveva e suas ajudantes e se esqueceu de contratar pessoal pra fazer limpeza, então ele mesmo teve que limpar tudo. Helena achou muita graça em tudo. Ufa!
A comida estava muito boa, os filhos animados conversando, e tinha a sua sobremesa predileta! Depois do jantar Helena entregou os presentes. Todos adoraram. Os filhos como era de hábito, saíram para seus compromissos e os dois ficaram sozinhos. Geralmente Jorge preferia ver televisão a conversar com Helena, mas hoje estava adorando conversar. Puxa ele sentiu mesmo a falta dela. Nem quando ela perguntou se ele estava cuidando da saúde, se tinha ido ao cardiologista, como estava a pressão ele achou ruim. Se  sentiu cuidado e isso era muito bom. Nem por Janaina ele queria perder isso.







                                                       Janaina


Já estava tudo certo para o plano final. O exame comprovando a gravidez, a investigação de tudo que ela precisava saber. Tinha ensaiado na frente do espelho, mil vezes de várias formas para saber qual seria mais eficaz.  Ainda assim ia dar uma chance para o Jorge. Ligou pra ele e o celular estava desligado ou sem bateria. Insistiu várias vezes sem sucesso. Só conseguiu falar com ele no dia seguinte. Marcaram de se encontrar como sempre.
Depois de ter demonstrado todo seu amor Janaina fez uma cara séria e falou que precisavam conversar. Jorge falou que também tinha umas coisas pra falar. Fala você primeiro, não, fala você. Ela insistiu que Jorge falasse primeiro. Tinha certeza que ele ia falar que ia se separar da mulher. Jorge então começou a falar que ela precisava ter paciência com o padrasto, evitar ficar em casa quando ele estivesse bêbado e abandonasse a idéia de ir embora de casa, pois sua mãe ia sofrer muito. Sua mãe, não ele!
Janaina ficou louca de ódio, mas não podia demonstrar, tinha que fazer cara de paisagem. Ah! Mas ele não perdia por esperar. Quando casassem ela ia botar um belo par de chifres nele.
Jorge quis saber o que ela tinha pra falar. Ela tinha pensado em falar que estava decidida a desafiar família e quem mais se opusesse para ficar com ele, mas casada. Diante do que ele falou, precisou mudar o que tinha ensaiado.  Com a cara mais séria que conseguiu fazer falou que aquele era o encontro de despedida, era a última vez que tinham ficado juntos, pois estava decidida a ir embora. Falou e esperou a reação dele. Jorge falou que essa não era a melhor saída. Ele não queria que ela fosse embora, que não aceitava ser a última vez que ficariam juntos. Ele queria muito poder casar com ela, mas isso não era possível, pois ele não podia se separar da Helena. Ele tinha prometido para seu sogro no leito de morte, que nunca separaria dela, pois ela não tinha estrutura pra ficar sozinha. Ele nunca tinha se queixado pra Janaina, mas a vida dele não era fácil. Só ele sabia o que ele passava com Helena. Ela era muito instável. Mas o sogro o tinha ajudado muito  profissionalmente. Era uma forma de gratidão cuidar da Helena e ainda tinha a promessa no leito de morte.
Janaina viu que sua mãe tinha razão: nenhum homem prestava. Infelizmente Jorge não era exceção. Que desculpas esfarrapadas! Tá certo que ela pegou-o de surpresa, mas podia pelo menos inventar coisa melhor. Mas era revoltante saber que ele não tinha interesse em ficar com ela. Porque a iludiu todo esse tempo? Ela havia acreditado que ele estava totalmente apaixonado, que o tinha nas mãos. Que decepção!
Janaina estava louca pra ir embora, não agüentava mais olhar pra cara enrugada dele.  Aquele velho estava pensando que porque tinha dinheiro podia ficar com uma jovem e na primeira dificuldade se livrar? Não com Janaina. Ele não sabia com quem se meteu. Janaina não via a hora de executar a última parte do plano.


                                                               Jorge


Jorge estava inconformado com a decisão de Janaina. Como ela se atrevia a entrar na sua vida e sem mais nem menos falar que ia embora? Será que ela estava blefando? Não tinha dúvida que ela o amava. Será que ela falou a verdade sobre seu padrasto? Será que não estava acontecendo coisa pior? Seria a única explicação. Ninguém desiste do seu amor assim. Sentiu-se um idiota por não ter pensado nisso enquanto estava com ela. Ela estava pedindo socorro e ele não percebeu, preocupado que estava em manter seu casamento. E agora não tinha como falar com ela. Não poderia aparecer no mercado e muito menos na sua casa. Era muito conhecido na região, não poderia dar margem a fofocas e nem expor Janaina. A solução era rezar pra ela ligar pra ele. Se ela ligasse ele iria protegê-la e não agir como um insensível.



                                                                    Janaina


Sabendo que a mulher de Jorge estava viajando e dada a urgência de resolver o problema, Janaina deixou de se encontrar com Mateus para dar seqüência ao seu plano. Quando chegaram ao motel Janaina foi a mais amorosa possível, depois fingiu estar muito triste. Lógico que Jorge ficou preocupado e perguntou o que tinha acontecido. Janaina fingiu que não queria falar pra fazer mais suspense. Como ele insistisse, ela falou que estava triste por causa do padrasto. Jorge ficou alerta, pensando no que poderia ter acontecido. Janaina falou que ele chegou bêbado e brigou com ela. Disse que ela só dava prejuízo e que tratasse de arrumar um emprego melhor pra ajudar mais em casa.  Sua mãe pouco podia fazer, pois com a doença que ela tinha, não conseguiria enfrentá-lo. Ela estava pensando em ir embora pra Bahia, morar com parentes da sua mãe. Disse isso com lágrimas nos olhos. Ao ouvir a parte de ir embora Jorge ficou preocupado, mas não falou nada, apenas fez carinho no seu cabelo. Janaina esperou a reação dele. Como ele continuou quieto, ela falou que o único problema de ir embora seria ficar longe dele. Ela não agüentaria. No começo tudo bem, mas agora nada do que ela fazia tinha graça, pois ela ficava pensando que gostaria de estar fazendo com ele. Ficava imaginando como seria acordar pela manhã com ele do lado. A mãe dela não tinha o direito de impedir a sua felicidade. Falou tudo isso e começou chorar. Jorge falava que tudo ia ficar bem, mas não dizia como.
Janaina ficou enfurecida com a reação de Jorge, ou melhor: a falta de. Se não houvesse urgência iria dar um gelo nele, só pra ele aprender. Teria que passar pra outra fase do plano.






                                                                         Jorge


Jorge não cabia em si com as palavras de Janaina. Sabia que ela gostava dele, mas não imaginava que era tanto assim. Mas deixando o contentamento de lado, ficou pensando  qual seria a solução. A casinha com certeza não era. Ainda bem que não tinha gasto dinheiro com isso. Sentiu que Janaina ficou um pouco decepcionada com ele. Será que ela estava pensando em casamento? Isso nem pensar. Não podia  se separar da Helena. Não podia se separar da fábrica de parafusos. Passou a vida toda lá, não saberia fazer outra coisa. Tinha certeza que alem de ser chutado, não teria nem uma carta de recomendação. Com o que tinha direito de receber no caso de demissão, não daria para viver muito tempo, pelo menos não do jeito que estava acostumado. Não queria ser pobre de novo. O padrasto tinha que atrapalhar logo agora que Janaina estava tão carinhosa? Poderia alugar a casinha, se encontrarem com mais conforto e menos gasto. E  essa maldita dor no corpo!

                                                                    Helena


Depois desse banho cultural e da companhia maravilhosa do Roger, Helena achava que não suportaria mais viver com Jorge. Sua única preocupação era que depois de separada, Roger insistisse em casar ou talvez morar junto. Ela não via mal se divertir com uma pessoa mais jovem, mas casar era outra história. Já bastava um casamento com a pessoa inadequada, não queria errar de novo.
Roger precisava retomar seus compromissos e Helena estava morrendo de saudade dos seus filhos, da sua casa. A viagem já tinha durado mais que o previsto, precisavam voltar. Quando chegasse em casa decidiria sobre a separação. Enquanto isso precisava começar os preparativos para a volta. Tinha que separar as fotos em que Roger aparecia e comprar os presentes que faltava.  Helena decidiu que não ia mais demorar tanto pra fazer outra viagem como esta. Foi bom demais.


                                                                         Jorge


         Quando Helena avisou o dia da sua volta, Jorge ficou contente, pois achava que as coisas voltariam ao normal. Dona Genoveva era competente, mas Helena era quem fazia a casa funcionar. Dona Genoveva tinha comentado da sujeira que tinha ficado o quintal. Se ela tivesse visto antes dele limpar... Precisava contar pra Helena da festa, antes que a dona Genoveva comentasse. Pensou até em organizar uma festa pra receber Helena, mas quando comentou com os filhos eles debocharam da idéia. Tudo bem, ele não dava muita sorte com festas mesmo.
A sua casa voltaria a funcionar direito, mas o problema da Janaina era preocupante. Não sabia o que fazer. Tinha que achar um meio de convencê-la a não ir para a Bahia. Tanta gente não se dá com o padrasto e nem por isso vai embora. Ela precisava aprender conviver bem em qualquer situação.  Ia aconselhá-la a ter paciência.  Não se pode desistir ao menor problema. Talvez quando ele não estiver bêbado até peça desculpas. Ela poderia falar que ia procurar um emprego melhor e ir levando até aparecer uma melhor solução. Sua mãe também não gostaria que ela fosse embora. O que Janaina precisava era de conselho. E continuar amorosa.













                                                                  Janaina


       Para a última fase do plano, Janaina precisava fazer um exame de laboratório que comprovasse a gravidez. Enquanto não ficava pronto o exame ia dar mais uma chance para o Jorge tomar a iniciativa de separar-se da mulher e casar com ela. Precisava também fazer umas investigações para a execução do plano. Rezava para não precisar chegar a esse extremo.









                                                                       Helena

         
      Adalberto foi buscar a irmã no aeroporto e colocou-a a par das retiradas de dinheiro que o Jorge fez. Contou também que ele deu a desculpa que era para Helena. A separação ia ser mais fácil do que ela pensava.
     Helena combinou com seu irmão de se reunirem no final de semana para mostrar as fotos e matar a saudade. Por enquanto ela só queria dormir para se ajustar ao fuso horário.

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